Pequeno texto depois de uma boêmia em Coimbra

E quando nos flagramos, depois de muito tempo mortos, apaixonados por esse desvio a que chamamos vida? E quando nos apaixonamos por aquela mulher que, como dizia Proust, por ser unica, é inumerável? E quando esta a que escolhemos dentre muitas para nos apaixonarmos singulariza-se por estar, não no lugar do exílio, enquanto chance futura, mas por ter ficado no lugar de onde se nos exilamos, enquanto possibilidade desperdiçada? Algumas mulheres são apaixonantes pelo que sua existência têm de nebuloso em nossa existência. Essa paixão nos alimenta como pão e sonhamos o contorno de uma nuca ou de uma barriga numa foto tirada numa sexta-feira qualquer na cidade deixada para trás. E pensamos: sim, eu poderia ter sido feliz com ela naquela cidade, ainda que não fosse possível. A mulher é sonhada, mas a vida é certa. Chega o momento de ser selvagem. Somente podemos ser selvagens na medida em que somos sérios. Ser sério e sóbrio para sonhar esta a quem devotamos o nosso mais delicado sonho numa noite solitária de uma cidade misteriosa.
p.s. é meio piegas isso tudo e sei que me arrependerei desse texto amanhã, mas considerem o fato de ser quatro da manhã por aqui e de eu estar completamente bêbado, depois de rodar a noite de coimbra e ouvir fados imaginários de amigos reais. Ainda assim, essa mulher impossível estava lá, irreal ao meu lado e real do outro lado do atlântico, com sua blusa e unhas negras, sua saia vermelha e seu cabelo cacheado. É sonhando-a que ela nos torna reais.

8 comentários:

senhorita rita disse...

"Somente podemos ser selvagens na medida em que somos sérios. Ser sério e sóbrio para sonhar..." Não se arrependa no dia seguinte não! Veja bem: ainda são 4 da manhã...

senhorita rita disse...

"Somente podemos ser selvagens na medida em que somos sérios. Ser sério e sóbrio para sonhar..." Não se arrependa no dia seguinte não! Veja bem: ainda são 4 da manhã...

senhorita rita disse...

"Somente podemos ser selvagens na medida em que somos sérios. Ser sério e sóbrio para sonhar..." Não se arrependa no dia seguinte não! Veja bem: ainda são 4 da manhã...

Edson Bueno de Camargo disse...

E eis que em um momento de insônia, escrevendo bobagens no twitter, dou de cara com este texto que traduzia exatamente o que eu estava sentindo.

Às vezes é preciso deixar rolar, acho que nos levamos muito a sério. poetas também são semeadores do caos.

Anna K. Lacerda disse...

E foi então que ela se perdeu entre os passantes... Nesse instante entendi que a ganhei.

Anônimo disse...

espero que o poeta (se) vislumbre (em) mulheres reais, com suas animas, fluxos, intempéries como componentes de uma indefectivel e sonhada beleza... Lindo o texto. BJO

Fábio Romeiro Gullo disse...

"A mulher é sonhada, mas a vida é certa (...) É sonhando-a que ela nos torna reais"

Poesia perfeita num texto que o autor cria já prevendo rejeitar. Mas as imagens sempre redimem a nós, às nossas obras (todas, mesmo as "piegas") e ao mundo. E dão o real à luz, é "claro" ;-)

Abração, Márcio, e continue iluminado pelas imagens.

Fábio Gullo

Márcio-André disse...

Obrigado, meus amigos. Quando falamos em paixão, todos falamos a mesma língua. A paixão é uma faca na água, mas é sempre bom o risco de ser perfurado por ela. Abraços

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