Dois poemas inéditos de Arjen Duinker


UM POEMA

Está bem,
Fizeste o teu trabalho, jardineiro,
E tu também, capitão centenário,
Também tu, cuidador de doentes, fizeste o teu.
Satisfaz-te com isso, fica contente,
Descansa e começa de novo.

Encontro-vos e reconheço-vos,
Tal como reconheço outros, e ainda outros.
Não estamos separados uns dos outros
Por dores inaceitáveis
Ou ruas perigosas ou planícies áridas
Que perguntam pelo âmago das nossas intenções.
Descansa e começa de novo.

Observo os mortos,
Observo os vivos.
Relembramos recordações
E rimos para as crianças que passam
E bebemos água de malgas pequenas.
Quando houver aguardente de figos, bebemos essa,
Com entusiasmo.

Os bancos e cadeiras estão às nossas ordens,
Fazem o seu trabalho mesmo no tempo mais frio.
Os motores do autocarro ajudam-nos
Tal como os cabos aéreos do eléctrico.
Deitados no chão, escutamos boquiabertos
Gralhas e tordos.


O pedreiro transpira pérolas,
O director de biblioteca apressado pega no casaco,
Reconheço-os e sorrio.
E tu que crias rapazes e raparigas
E distribuis jornais e consertas peças de roupa
E estudas matemática nas horas avançadas
E lavas agora, exausto, os cabelos,
Está bem.

Reconheço-te e sorrio.
Descansa e começa de novo.
Pinta os lábios ou deixa-os como estão.
Espeta pão num cajado e vai vadiar por um dia,
Todas as idades reconhecer-te-ão e encorajarão a tua alegria,
És uma flor.

Os arbustos e árvores não são violentos,
Protegem-te e oferecem sombra.
O vento desafia as tuas moléculas,
Ainda bem.

Deixe que sol e lua saibam como te chamas
Sem que pronunciem o teu nome.
As estações e os meses,
As noites e os dias,
Eles reconhecem-te, reconhecem-nos a todos.
Subimos ao monte e descemos
E comemos com mais experiência.

Tu também, consertador de bicicletas,
E também o funcionário das piscinas
E também quem decreta falências
E também o músico nos teatros lotados
E também o plantador de arroz e o guardador de cabras.
Vocês trabalham muito.
Descansa e começa de novo.

A madeira dos telhados
É tão forte como a madeira das passadiças
Porque foi cortada com um sorriso.

Não sei mais do que vocês sabem,
Cuspo nos meus sapatos e puxo o brilho
E sigo o meu caminho
Passando pelos conventos dos monges,
Pelos grupos de armadores de ferro,
Pelos pedintes de olhos negros,
E não me esqueço de vocês.

Amo mulheres e abraço homens,
Digo disparates a crianças
E pego nelas ao colo.
Espelho-me em nada,
Cada segundo é uma nova era.

Não estamos separados uns dos outros pelo silêncio
Ou pelo atroar das nuvens
Ou pelo calor do fogo,
Falamos e depois calamo-nos
E saímos para a chuva.

Reconheço-te e sorrio.
Descansa e começa de novo.
Pinta os lábios ou deixa-os como estão.
Espeta pão num cajado e vai vadiar por um dia,
Todas as idades reconhecer-te-ão e encorajarão a tua alegria,
És uma flor.


NENHUM POEMA

Idem.


Arjen Duinker, de Buurtkinderen (2009)
Tradução Arie Pos

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